quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

(A)tra(I)ção


A vida não toma o rumo certo de meus pensamentos porque meus pensamentos não são certos. Sou desviado a olhar aquilo que projeto de verdadeiro. Mas a verdade só existe em meu íntimo e não há consenso. Permanece a ilação. Projeção daquilo que julgo estar certo, e, por vezes a certeza me trai. Sinto-me (a)traído por meus desejos mais íntimos. Por meus anseios. Por minhas projeções. Quão belos os jovens em suas inconstâncias certezas. Que bom poder desfrutar dessas variáveis sem estar vulnerável. O certo me arma. Ou me engessa ? Cuspo aquilo que me atormenta. Devoro o que me é belo. E como é (o) belo ! Farta-me a vista. Eis a falha ... ser (a)traído pelo desejo de possuir o belo ! As vezes (o) tive. Sou (a)traído por sua juventude. Quanto vigor que me atormenta o pensa(senti)mento. Não me furto a essa realidade. A eloqüência dos meus atos tenta me guiar. Me diz o que não fazer. Tudo em vão. Eis que no fim me indago: porque sucumbo ? Porque assim o sou ! Eterno dependente e sucumbente de minha lasciva. Podre. Ocre. Enfim, humano.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Breu



Sentiu naquela madrugada a pior forma de cominação humana. Nada fazia esmorecer aquele sentimento que brotava de seu oco ventre. Nada podia afastar a insatisfação de seu famigerado estado. Nada mudaria o rumo do sono perdido.

Buscou a dor, mas ela fugia-lhe a frente, embalava um falso mal estar. Era dormente aquele instante, como um velho vernáculo que insistia em não lhe sair da boca. Lembrou de uma prece, ou do que restou dela, insuficiente para lhe assegurar a realidade.

Perdeu o súbito moral, a consciência anormal, o delírio racional, o óbvio habitual

Misturou-se ao tempo.
Tornou-se o nada.
Esvaiu-se de si mesmo.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Tríduo


Temo

a noite que me faz incerto
o dia que me revela
a vida que me consola
a morte que me espera


Exalto

o riso que está por vir
o belo que me pertence
o desejo que não se acaba
a fúria que me acalma


Desprezo

o vazio que me entranha
o ego que me enaltece
a dúvida que me persegue
o fardo que me carrega



sexta-feira, 21 de agosto de 2009

retalho

(...)
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
(...)

Trecho de Tabacaria - Fernando Pessoa

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Verbo

Irreversível viver
Imensurável sentir
Incansável olhar
Intocável pulsar
Intolerável falar
...
Infalível ser

sexta-feira, 10 de julho de 2009

TEMPO MUDO


Hoje acordei mutante. Aliás, acho que todos os dias acordo mutante. Não, na verdade estou em constante mutação. Talvez a vida realmente seja isso, uma mutação em andamento. Digo isso porque hoje me sinto diferente de ontem, não sei ao certo se evoluí, mas sei que saí do lugar. Ainda não consigo perceber se pra frente ou pra trás, mas saí do lugar. Será isso uma evolução ou um retrocesso ? Prefiro acreditar que seja uma evolução, mais um passo nessa metamorfose inconstante. Mutação não retroage, avança ! Mas pra onde ?

É mudança, é certo. Os sinais indicam mudança. Os ventos trazem mudança. Sinto cheiro de nada. Nada gera o ócio. O ócio não gera nada. Não avança. Não muda. Estabiliza ! Mutação estabilizada ? Não, definitivamente não. Meus cabelos cresceram. Tenho que fazer a barba. Os sinais do tempo indicam mudança. São as rugas na minha fronte. O meu pensamento que não processa as informações na velocidade do tempo. Não, não é uma evolução é um retrocesso. Será ?

Mutação, metamorfose, mudança. Tudo passa. Mas o tempo não. O senhor de tudo. Ou quase tudo. Mudo, desmudo, transmudo. Sigo o tempo. Não o vejo. Não o sinto. Talvez por isso esse cheiro de nada. Talvez por isso esse ócio. O tempo não muda. O tempo é estático, estável, parado ! Passo pelo tempo. Mudo o tempo. Mas ele não faz nada. Ele é o ócio. A mudança se fez no relógio. Uma hora pra frente. Muito acontece em uma hora. Mas o tempo continua sendo o tempo. Uma hora a mais ou a menos, tanto faz. Mudo. Tempo. Mudo.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

BRIO

Uma névoa densa se deita sobre a manhã. Não se consegue distinguir os traços das pessoas, que se locomovem sem se importar com a mesma. Talvez seja essa a razão da despreocupação. Andar sem ser visto. Se camuflar no imenso vazio da tez da manhã. Se desentranhar ou talvez se desintegrar e desejar virar a própria neblina que tinge de branco esta alvorada. É estranho o fato das pessoas tornarem-se leves, limpas, auras. São pessoas jogadas ao vento, que se movem sem qualquer direção. Sim, estão despojadas ou talvez despudoradas, por isso a leveza. Estão transparentes e alvas e isto que as tornam inodoras, incolores, intimistas, insípidas. Mas é só. Nada disfarça o brio infeliz de suas inexistências.

sábado, 20 de junho de 2009


Desta vez sou eu
Outra vez és tu
Agora
Talvez depois
Após ?
Jamais
Tanto faz
Aqui jaz